sexta-feira, 26 de junho de 2009

Who's bad?

O Michael Jackson mórreu. Fiquei chocada, mas com aquele sentimento de que mais cedo ou mais tarde isso poderia acontecer. A gente sabia que ele nunca foi um exemplo de ser humano saudável. Pelo contrário. Foram tantas as doenças, confirmadas ou não. Problemas de ordem pessoal que tornaram-se mais públicas que a vida sexual da Paris Hilton. Não é de se admirar que depois de tanta merdalhada excretada, o Rei do Pop fosse destronado por um ataque cardíaco. O coração suporta muita coisa, mas quando a cabeça é tão bagunçada quanto o guarda roupa da minha irmã, a coisa complica pra valer.

Por falar nela, estávamos a vagabundar na frente da televisão, agora pouco, quando o aparelho do quarto da minha mãe (que sempre se encontra em volume equiparável ao das carroças que vendem cd's piratas nas ruas) começou a despejar no ar mais e mais músicas do astro. Desde ontem tem sido assim. Quando alguém beeeeeeeem famoso como ele "desaparece" (eu odeio quando dizem isso; fulano desapareceu... parece até que foi sequestrado, que nem o Narcisinho) e um canal não passa 24 horas falando sobre o fato, estranhamos. Afinal, nós, que possuimos um lado voyeur e fofoqueiro para tudo que se possa supor, queremos saber cada detalhe. Como foi, está sendo e será. Mas pelo amor de Deus. Chega um momento que a super exposição enche o saco. E o de Cecília já transbordou. Não à toa, ela se vira pra mim e pede desculpas por não suportar mais ouvir uma noticiazinha, musiquinha ou coisinha que fosse sobre a vida e morte do eterno menino prodígio que nunca quis virar adulto. Eu sou um monstro por pensar assim? Respondi com risadas, das risadas que ela conhece como um eu entendo você. Fiquei pensando. Em todas as palavras que utilizamos para exprimir o que sentíamos cada vez que um escândalo era anunciado nos últimos anos. Repulsa, pena, descrença, e por fim, esperança. De que o mundo que o admirou e idolatrou pudesse voltar a sentir orgulho pelos acontecimentos que o moldaram e transformaram em um artista máximo naquilo em que era um verdadeiro especialista.

Mas... agora ele se foi. A morte desse e de muitos outros ídolos tem seu lado bom e ruim. Perde-se a lacuna do futuro, exalta-se o brilhantismo do passado e esquece-se a tragédia do presente. Sabe minha irmã... não acho que você seja um monstro. O falecido sim. Esse o era e sempre será. Um monstro sagrado da música, da dança e das inovações midiáticas. E é isso que importa agora.



Thriller, 1982.

Não fuja da raia. E sempre diga alô

Ontem eu acordei cansada pra dedéu. Desses cansaços que fazem o cérebro sinalizar uma greve de advertência. Quando fico assim, geralmente passo o dia muda, quase não troco uma palavra com ninguém. Por preguiça mesmo. Eu já não falo muito. Imagina nessa situação. Só abro a boca com prazer se for pra devorar um bom (ou não) prato de comida, bocejar, beber água e escovar os dentes. Depois do café da manhã e antes de dormir, né, que eu não sou besta nem nada. Que minha dentista não fique sabendo. Mas vai ser difícil esconder esse fato quando ela for examinar minha arcada dentária e encontrar trinta e duas cáries. Trinta e duas não, vinte e oito. Já contando com restaurações anteriores. Assim como os molares superiores e inferiores que já foram parar na sacola da fadinha dos dentes há um certo tempo. Bobági. Chegando lá vou alegar que tenho baixa imunidade bucal. O Ph da minha saliva é doentinho, não aguenta vestígio nem de folha de alface. E olha que eu uso fio dental diariamente, palavra!

Ainda assim, por mais que eu tente fugir da raia, existem aqueles pormenores dos quais não dá para escapar. Ter que responder a mesma pergunta que minha mãe faz umas seis vezes, por exemplo. Ela é insistente, a criatura. Ou atender às chamadas telefônicas que ninguém se propõe a fazê-lo. Sempre tem um momento do dia em que o povo resolve fazer tudo ao mesmo tempo. É um que está cagando, outro que está vendo algo na tv e que não pode ser interrompido nem sob ameaça bio nuclear. E têlêlê têlêlê têlêlê... sobrou para o "desocupado" do momento. No caso, moá. Acontece que exatamente naquela hora, ou melhor, desde algumas horas antes, eu vinha cantando mentalmente algumas canções, para não enferrujar a cuca. E para espantar os males também. Entre elas estava a música "Bad Things", tema de abertura da série norte americana True Blood. Acho-a sexy, carismática. Fora que me remete às cenas dos últimos episódios dessa ótima segunda temporada que acabou de começar. E que está foda.

Entre um verso e outro, me fixei na frase do refrão principal: I wanna do bad things with you. Dentro da minha cabeça. Repetidamente. Puxei o gancho do telefone. Mexi os lábios. I wanna do? Silêncio. Percebi a merda que fiz. Humm.. a-alô? Do outro lado, a moça da Associação de Cegos que nos liga todo mês com o intuito de nos lembrar da "contribuição" que contribuímos... todo mês. Nem reconheceu minha voz. Logo ela que toda vez me cumprimenta com um Olá Isabel, como você está, tudo na paz? antes mesmo que eu me identifique. Mas não guardo ressentimentos, Érica. Nem todo mundo está pronto para a poesia de um alô diferenciado. E musicado também, que se diga.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Inshala meu Pai!

E o Theo Becker continua tocando o terror na fazenda. Ontem foi dia de formação da berlinda. Não deu outra: mandaram o maluco pra roça. Os outros participantes foram praticamente unânimes em sua decisão: querem o galego do lado de fora da cerca. Não que isso já esteja garantido. Afinal, a votação termina no próximo Domingo e quem escolhe o resultado somos nós, fiéis telespectadores. Deveríamos, pelo menos ao meu ver.

O pessoal que apresenta o Hoje em Dia - programa matinal que explora o A Fazenda através de discussões acerca dos "resuminhos" e imagens transmitidas ao vivo - tenta manipular a opinião dos eleitores de casa da maneira mais descarada possível. Mostram os bate bocas, os motivos que os originaram (quas
e sempre tão idiotas quanto àqueles que os suscintaram), fazem cara de reprovação mas, no final das contas, justificam as atitudes tidas como vilanescas. Falam pra gente lembrar que é tudo feito diante de uma enorme pressão, que o louraço beuzebu está sofrendo de amor, tadinhôôô, é impulsivo e não pensa antes de falar.

Vamos imaginar duas possíveis situações: 1 - O futuro representante dos pneus Pirelli é escolhido pra deixar o reality show, a paz supostamente voltará a reinar e todos serão felizes para sempre até que o prêmio de 1 milhão os separe; 2 - Ele fica, evoca os poderes de Greiscow e passa na cara de todo mundo o quanto ele tem a força. Evidente que a segunda opção parece muito mais atrativa, hã? Mesmo que tenhamos de ouvir os milhares de piiiiiiiiiiiiiiiiiiii's utilizados pela edição toda vez que o Theo resolve infernizar a vida de alguém. Não é um palavrão proferido aqui e ali que faz o caráter de alguém, certo? Eu mesma falo porra sempre que topo meu dedinho em alguma quina de parede. Nem por isso você deve me achar uma má pessoa, faça-me o favor! Também não é feio dizer que vai arrebentar o rosto do seu "adversário" ao ponto dele nunca mais conseguir trabalho no cinema e/ou televisão, a não ser que seja interpretando alguém em uma cadeira de rodas. Isso porque só a cara que iria ser quebrada, heim? O que importa é manter a boa audiência, garantida pelas campanhas maciças da Rede Record e, acima de tudo, por nós que dedicamos algumas horas do dia diante da TV, acompanhando tudo isso e muito mais que eu nem vou perder meu tempo citando aqui.

Temos três opções: o valentão Theo, o bundudão Miro e o negão Jonathan. Polêmicos e falastrões todos o são. Mas dentre as gafes e "crimes" cometidos, certamente o de falar mal dos pelos pubianos da mina que acabou de pegar é o pior de todos, fala sério! Nessa o modelo leva a pior. Se eu fosse votar, apertava o botão de confirma assim que a foto dele aparecesse na tela. Fora Miro, menino malvado!

Acontece que tem um pequeno detalhe que a gente não está levando em consideração: quem vai decidir essa parada, meus amigos, é Deus. Isso mesmo! Segundo palavras do próprio Theo Becker será o Todo Poderoso que irá resolver esse entrave. Ele, em alma e luz amém, lá das alturas, vai fazer todas as ligações, vai mandar todos os sms's, vai acessar infinitas vezes a internet e escolhar quem vai e quem fica. Nada de Ana Hickmann, Chris Flores, Celso Zucatelli, Edu Guedes e Britto Jr. Quem está entoando o mantra do "compre a fazenda, compre a fazenda, compre a fazenda e mantenha o gaúcho" é o Senhor lá de cima. E convenhamos: com Ele nem o capeta pode. Ops, nem o Theo Becker pode. Ou será que pode?

















Theo Becker

quarta-feira, 17 de junho de 2009

O melhor amigo do bicho é o bicho

Há uns quatro dias que eu venho pensando nisso. Não o tempo todo, como quando a gente se apaixona por algo ou alguém e passa praticamente 24 horas com a mente neles. Ao acordarmos, durante o dia, pela noite, de madrugada, nos sonhos e até mesmo nos pesadelos. Oras... eu sou meio assim... maníaca-compulsiva-obssessiva, com um que de neurótica e psicótica. Uma pessoa comum, como todo mundo.

E sendo uma pessoa comum como todo mundo, eu só sosseguei quando finalmente desvendei o mistério que rondava meus pensamentos. Levei esses quatro dias os quais referi anteriormente. Ah, vai! Pra descobrir mesmo, na moral, foi questão de segundos, confesso. Acontece que eu nunca lembrava de buscar a resposta, só me recordava da pergunta. Daí que eu imediatamente questionava os que estavam próximos à mim. Mas eles também não sabiam do que se tratava. E eu voltava a esquecer. De procurar onde certamente iria encontrar.


Tem uns 3 meses que meu pai chegou aqui em casa com um filhote de cachorro. Uma fêmea de aproximadamente 45 dias de nascida. Coisa mais linda, mô Deus. Eu adoro filhotes. Fico ainda mais imbecil quando vejo um, seja na televisão, ao vivo, se eu puder pegar então,
melhor ainda. Filhotes de animais "fofinhos", né? O que exclui a maioria dos répteis e muitas das criaturas que habitam nossos horrendos esgotos. É uma coisa séria essa minha mania. Quando criança, levei altos arranhões de gatos, mordidas de vira latas de rua, "carrêras" de galinha, de bodes, cheguei ao cúmulo de ser atacada por um passarinho ao tentar mexer no seu ninho, coitadinho. Olha que rimou, que bonitinho. E isso não melhorou com o tempo, acredite. Claro que eu aprendi algumas lições, limitando-me a cutucar os bichos que não me atacariam, pelo menos de imediato.

Foi desse jeito que um colega de faculdade fotografou uma amiga e eu com as mãos no dorso de um boi: nós, de um lado, braços esticados, sorrisos nervosos; do outro, o tratador - de bigode farto - todo orgulhoso por exibir seu premiado. E tome demora pra nosso companheiro de viagem conseguir controlar o riso, firmar a mão e acionar a máquina. Foi uma agonia, a gente falando entre os dentes "Booooooooooora! Vai logo antes que ele se arrete e resolva nos chifrar, pô!; enquanto o bigodudo nos dizia pra termos calma, que não era assim, daria tempo de corrermos e evitarmos danos maiores. Que belo.


Mas voltando a Camila Pink. Esse foi o nome escolhido. Meu digníssimo genitor olhou pro focinho dela e achou que Camila tinha cara de Camila. Ficou Camila. Pink em homenag
em ao nosso cachorrinho que morreu no início desse ano, sacrificado, após ser diagnósticada uma doença incurável. Fora que o povo daqui adora colocar "nome de gente" em animal. Vide Sofia (meu amor), Lolita, Rebeca, Pierre, dentre tantos outros. Pois que quando eu avistei Camila Pink pela primeira vez, meu impulso inicial foi pegá-la no braço, falando com voz de adulta abestalhada "ô Papai, uma salsicha!" (opa, muita calma nessa hora). Cor de chocolate, olhar esperto, cheirando a perfume de bebê, Camila Pink chegou chegando, subindo na cama das outras cadelas, comendo da ração, bebendo da água, correndo na garagem e fazendo charme com a cabeça sempre que ouvia um barulho diferente. Preciso nem dizer que ela já conquistou a todos, incluindo o pessoal da padaria, do salão de beleza, dos mercadinhos do bairro. De tantas fotos e vídeos produzidos e exibidos com regularidade. Difícil controlar o ciúme de Sofia, a matriarca que engordou um bocado, tamanho o receio de perder seu status de preferida.

Como Camila Pink ainda é um filhote, carregá-la pra lá e pra cá continua sendo uma tarefa deliciosa e constantemente realizada. É o que eu digo: ela não será pequena pra sempre. Pelo menos no comprimento e na largura. Sem contar que seus dentes não constituem uma ameaça mortal. Por enquanto. Fica fácil chamegá-la, pegar suas enormes orelhas e virá-las pra trás. O que a deixa parecida com um ursinho, daqueles que gostam de comer eucalipto, vivem em árvores e são bastante raros de se encontrar. Toda vez que ela fica assim eu lembro desse ursin
ho. Louca pra saber sua denominação. Tipo: "eita, Camila tá parecida com um daqueles ursinhos que comem eucalipto! Como é o nome mesmo? Heim gente? Como é? Aquele, que é bem lindinho e o nome começa com M, se não me engano!".

É. Eu entrava na internet, fazia tudo e nada de pesquisar o nome do ursinho que gosta de eucalipto e parece com Camila. Não, que Camila parece com ele. Aquele, droga. Quatro dias nesse "couro de pica", como diria minha mãe. Ontem, antes de dormir, disse a mim mesma que um sonho iria me solucionar esse caso. Eu acordaria leve e poderia me concentrar em outra coisa tão séria quanto essa.
Dito e feito. Passei a madrugada sonhando que ia pra uma reserva florestal, de jipe e tudo, olha! Via o tal do animal. E seus filhotes, obviamente. A madrugada inteeeeeeeeirinha. Abri os olhos pela manhã, visualizei o nome na placa do zoológico. Branco. Deu um branco. Voltei a esquecer. Aliás, voltei a não lembrar. Assim como voltei a perguntar, dessa vez afirmando que a letra inicial era K e não M, viu? Acha que adiantou alguma coisa? No decorrer do dia, chequei meus e-mails, o orkut, olhei umas matérias sobre Selton Mello. Desliguei o computador. E o nome do ursinho? Agora Inês tinha ressuscitado. E eu... nada. Posteriormente, conversando com minha irmã (que já havia sido interpel
ada umas 15 vezes), descrevi meu sonho. Ela vira pra mim e diz: "Né um Koala, não?". "Rapaz! É isso mesmo!". Começamos a correr pela casa, rindo que nem umas doidas que acabaram de encontrar uma peça de roupa pertencente ao Jude Law, um dente de ouro do Jonnhy Deep, um diário do Chico Buarque, e por aí vai. Chega fiquei feliz!

Um Koala, quero dizer, Coala. Fiz umas pesquisas, olhei umas imagens. Do marsupiau acinzentado de grandes orelhas que em nada lembram as de Camila Pink. Opa. Que de nada as orelhas de Camila Pink lembram. Mas sei lá. Eu cismei que parecia e pronto. Quatro dias. Uma madrugada inteira. Um monte de gente tendo seus sacos preenchidos com a pergunta que não queria calar. Do ursinho que gosta de eucalipto e ninguém sabia o que era.
















Camila Pink

They'll miss the good old days


"Oh, my ex says I'm lacking in depth

I will do my best
Are you say you wanna stay by my side
Darling, your head's not right
I see alone we stand, together we fall apart
Yeah, I think I'll be alright
I'm working so I won't have to try so hard
Tables they turn sometimes
Oh, someday
I ain't wasting no more time"

Someday, Strokes

sábado, 13 de junho de 2009

We love you


Dizem que quanto mais ele envelhece, mais saboroso fica.






















O Johnny, lógico.
Achou que era o vinho?

Calosandando

Quem se propõe a andar com o calçado inapropriado sempre corre o risco de machucar os dedos.


Mas essa é a graça das caminhadas inesperadas.

Pés sem calos não contam causos.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Eu sou lunática



























E você?

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Do Erico, não do Fernando


E eis que ao término de uma extensa leitura fica àquela sensação de vazio. Saudade dos novos conhecidos, dos que se tornaram melhores amigos. Do ficar imaginando como haverá de ser. E quando o fim se aproxima, você devora as frases com uma voracidade que só a curiosidade é capaz de instigar.

Demorei quase dois meses completos. Foi há umas três semanas atrás que dei meu adeus à Antares, ao coreto e aos mortos. Ainda sinto falta deles. Dos vivos que não morreram e dos defuntos que sobreviveram.

Afinal, foram 485 páginas. Uma relação dessa proporção não se esquece facilmente. Nem assim o desejo. Não vou aqui fazer crítica, resenha, nem nada do tipo. O carinho e admiração que sinto pelo ser humano João Paz, pelo idealismo do Padre Pedro Paulo, pela vivacidade de Valentina, pela ingenuidade de Erotildes e a lealdade de Rosinha, seriam difíceis de descrever. E foram tantas as lágrimas derramadas diante da fatalidade que acometeu Menandro Olinda; foram tantas as gargalhadas que ressoaram na calada das minhas madrugadas, lendo em voz alta as reações ensandecidas dos que acreditaram piamente que o fim estava próximo; foram tantos os dilemas travados, as denúncias escancaradas, o passar do tempo que nunca pára. História e "ficção" ironicamente emaranhados.

Incidente em Antares foi o último livro escrito pelo romancista brasileiro Érico Veríssimo, em 1971. A primeira obra (dele) que li até a última página. Cheguei muito perto com Olhai os Lírios do Campo. Mas a correria da faculdade e as renovações expiradas da biblioteca impediram-me de completar essa missão. Fiquei com a saga do Povinho da Caveira. Sem trocadilhos.

"(...) Nasciam em Antares os boatos mais desencontrados. Ora, um boato é uma espécie de enjeitadinho que aparece à soleira duma porta, num canto do muro ou mesmo no meio duma rua ou duma calçada, ali abandonado não se sabe por quem; em suma, um recém-nascido de genitores ignorados. Um popular acha-o "engraçadinho" ou monstruoso, toma-o nos braços, nina-o, passa-o depois ao primeiro conhecido que encontra, o qual por sua vez entrega o inocente ao cuidado de outro ou outros e assim o bastardinho vai sendo amamentado de seio em seio ou, melhor, de imaginação em imaginação, e em poucos minutos cresce, fica adulto - tão substancial e dramático é o leite da fantasia popular - começa a caminhar pelas próprias pernas, a falar com a própria voz e, perdida a inocência, a pensar com a própria cabeça desvairada, e há um momento em que se transforma num gigante, maior que os mais altos edifícios da cidade, causando temores e às vezes até pânico entre a população apavorando até mesmo aquele que inadvertidamente o gerou".

(Verissimo, pág. 117-118, 1971)


E que venha a minissérie!

Pois foi, foi


Então iria ser assim: ela entraria na livraria, compraria o dvd e voltaria o mais rápido possível. O dia tinha sido cansativo. E ainda sobravam algumas horas a serem aproveitadas fora de casa.


No início, ela relutou. Não queria aceitar o dinheiro que acabara de cair do céu, assim, de repente, pegando-a de surpresa. Sabia que por detrás daquela "oferenda" haveria cobrança e "passação na cara". Mas oras, que se dane! Isso acontece o tempo todo mesmo, pensou. Era por uma ótima causa. Ela desejava que aquele filme fizesse parte de sua coleção há muito tempo. Já estava mais do que na hora.

Foi-se. De braços dados com a irmã, pipoca doce murcha em mãos e a nota. Procuraram, ambas, em todos os locais indicados. Nas prateleiras habituais. Nada. Nos balcões. Nada. Na sessão de seriados. Muito menos. O telefone toca. Queriam saber o motivo de tanta demora. Explica-se. A ligação cai.

Sentindo o estômago pesado devido os excessos do almoço comemorativo (como se isso fosse desculpa, a "comemoração"), sobe a escada que leva ao andar de cima. Ali sim. Não era possível que não estivesse ali! Reiniciam a busca. Comédia. Hummm, não. Terror. Não. Ficção, Clássicos, Cinema Europeu, Novidades, Documentários... Cinema Brasileiro. Não, não, não, NÃO. O celulares vibram. Disseram que está na parte térrea, perto das revistas. E olha que ela nem sabia que essa "parte das revistas" existia. Achou estranho. Ficou parada, olhando para a cara estarrecida da irmã que, impaciente, insistia, em vão, que recorressem à algum atendente. Nossa, que delícia esse leite condensando concentrado no fundo do saquinho... adoro essa música que tá tocando agora... ei! Despertada de seu transe, abruptamente, por meio de sacolejadas nos ombros, ela dirige-se até o balcão de informações, à caça de alguém que as auxiliasse na complicada tarefa de encontrar o escorregadio objeto. Espera algum tempo. Todos ocupados. A recepcionista chama alguém pelo interfone e antes que a mesma pudesse dar-lhe alguma resposta, ela sorri irritada e se vira.

E o vê. Vindo em sua direção. Alto. Nem gordo, nem magro. Pele morena. Nem tão escura, nem tão clara. Uma cor meio de jambo, sabe. Cabelos lisos, castanhos. Os olhos esverdeados encobertos por uns óculos legais. Uma barbicha rala brotando do queixo. E um sorriso. Logo ela, que tinha mania de se perder, também, nos sorrisos. E aquele sorriso cordial, sinalizando um posso ajudar?, pareceu tão perfeito naquele momento, que ela ficou sem ar por um instante. Quase esquecendo do que deveria perguntar. Permaneceu daquela maneira, contemplativa, enxergando luzes de neon, ouvindo o que proferia em câmera lenta. Er... vooooooooooooocê saaaaaaabe dizeeeer se (que fofo ele!) se teeeeeem um filmeeeeeee chamaaadoo PulpFiction? (aqui ela procurou falar mais rápido, sabem os deuses porquê). Ele sorri novamente, vai até o computador, faz uma busca. Sim, temos sim. Ela olha para a irmã, que percebe seu encantamento. Perguntam o preço. Muito mais caro do que poderiam pagar. Maaaaas eu sooooube que tem (o que dizer?) umaversãomaisbarataàvendaaqui... Ele olha para ela, sorri aquele sorriso de novo e responde que não, que ela estava enganada. E sugere um outro filme para compensar a aparente frustração, falando meio assim, como se ela não entendesse dessas coisas, ué. Ela agradece com um movimento sensual de cabeça (pelo menos ela tenta) e sai dali acanhada, lentamente, entorpecida.

Ééééé! Eu vi você viu? Toda "assim" pro lado do atendente!
Eu não.
Uma graça ele... só não é mais bonito que o meu "cara Superbad"...
Heim?
Aquele! Da sessão de cd's...
Ah! hahaha.. é mesmo! Se parece! Mas esse moreno é mais gatenho...
Ele faz mais teu tipo. Mas eu vi primeiro...
(mulher tem dessas coisas, essa sede por patentear)
Que viu que nada!
Vi sim! Ele tava sentado...
Num banquinho lá perto da escadaria do shopping. Eu sei, eu vi também. Toma pra tu.
Tava almoçando...
Então. Mas eu já tinha visto ele antes disso. Na verdade, eu sempre vi. Desde as primeiras vezes que a gente veio aqui. Papai até bateu um papo com ele uma vez. Perguntando sobre como que se fazia pra trabalhar aqui e tal...
Menina! Quando foi isso?
Ah, naquele dia que eu mostrei "Vigiar e Punir" pra papai.
Sua danadinha...
(olha aí a importância do ver primeiro)
É... eu até fiquei me sentindo meio safada na hora, por estar olhando com milésimas intenções.
Porque?
Porque eu era uma moça comprometida, oras!
Eita! E tu ia deixar de olhar por causa disso, é?
Deveria... não?
E deixasse de olhar?
Tu acha? hahahaha

Decidem separar-se. Dar uma última olhadela. Quem sabe? Ela termina de comer seu petisco e joga a embalagem no lixo. Percorre com os olhos cada cantinho da loja. Encontra livros que gostaria de comprar. Outros que só de graça e olhe lá. Desistem. Vai ver o moreno tinha mesmo razão. Enquanto encaminham-se até a porta de saída, mais um telefonema. Dessa vez a informação que vem do outro lado é clara e certeira. É no fundo da livraria, meninas! Ok. Fundo da livraria. Aí que, de repente, ela perde o chão.

O dinheiro!
Que tem o dinheiro?
TAVA JUNTO COM O SACO DA PIPOCA!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
E cadê?
EU JOGUEI NO LIXO, POOOOOORRA!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Fudeu! Agora fudeu!
FUDEU TUDO! QUE É QUE EU VOU DIZER??????????????????????????????????????????
Tu num lembra em que lixeira jogasse não?
não...

E ela fica ali. Atordoada. Rindo à toa. Desesperada. Louca. Até que a irmã (benditos sejam os frutos da vossa esperteza!) encontra a cédula, dobradinha, intacta. Alívio geral. Risos. Compram o dvd e saem da livraria. Renascidas. Ressarcidas. A irmã fazendo graça. All you need is love. Passam-se alguns minutos. Ela volta a ouvir música. Pensando na burrada que tinha feito. Mas sentido-se bem. Sentindo-se mulher. Pela paquera. Pelo sorriso. Pelos 20 reais quase perdidos.

Homem nenhum vale 20 reais jogados fora! Se ao menos fosse compartilhado, né não?
Claro.


Ela já sabia


Pois né que ela tinha mesmo razão, aquela danada? Parece até que sabe das coisas, a mulher.

Pois né que ela sabia mesmo!
Eu é que sou teimosa.

Oh, Vida!

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Em transe


É ver
quem está do seu lado
com gana
de
viver
enquanto você

pensa
em
permanecer
na
zona confortável
do
sofá da sala
sozinha
sentada
no banquinho do
banheiro
lendo
um livro
na cadeira
de
balanço
ouvindo
música
na cama
calada
no escuro
da
madrugada